03/03/2008

O suinicultor amigo do ambiente

É dono de uma suinicultura e tem, quiçá por osmose, um ar vagamente porcino. A gordura que lhe sobe da barriga e chega ao pescoço entope-lhe a voz, que sai numa espécie de ronco afogado. Apesar do ar pouco apessoado, parece que é doutor, quem diria. A sua empresa descarrega as águas residuais (as domésticas e as industriais) para a ribeira mais próxima, e é por isso que está ali. Discorre poeticamente perante o juiz sobre a importância do ambiente para as gerações futuras e de como a sua empresa cumpre tudo e mais alguma coisa, nota-se um quase tremorzinho na voz de gargarejo. Descreve com orgulho os benefícios de uma ETAR própria que em tempos construiu, tentando convencer o tribunal do depuramento eficaz dos restos dos porcos mortos, mil e quinhentos por semana. Que fez pedidos e aguarda respostas, por isso não tem licenças. Na empresa há também um furo, a mais de duzentos metros, bomba de cinco cavalos. Há anos que vem roubando a água ao domínio hídrico, ou seja, a todos nós, milhões de litros de água que limpam a porcaria que é transformar porcos em chouriços e salsichas. E assim, de facto, se assegura o futuro das gerações: pelo menos não morrem à fome. Por este pecadilho, arrisca quinhentos euros de coima. Quinhentos euros. Que mesmo assim não quer pagar (e por isso está ali). Enquanto o juiz fala, afoga mais uma vez a respiração num ronco e olha de lado para o rolex de ouro no pulso peludo, tempo é dinheiro. Só o ambiente se vende barato, quase dado, neste país.